ROTA DAS
EMOÇÕES 2014
Primeiros
Dias – 24 a 27 de agosto
Mais uma vez volto ao Nordeste, para, junto à esposa e
amigos, curtir as delícias da Rota das Emoções, de bicicleta, pelos estados do
Ceará, Piauí e Maranhão; assim é chamada pelos três estados nordestinos, porque
abrange locais turísticos maravilhosos, como Jericoacoara, de onde escrevo
agora, o Delta do Parnaíba e os Lençóis Maranhenses.
A primeira vez que passei por aquelas bandas, de bicicleta,
foi com a Carmo, em Março de 2008. Fiz o roteiro de São Luis a Fortaleza. Não é
época de tantos ventos, mas de qualquer forma se tornou um passeio complicado. Estava
“desbravando” ainda a rota, e vivemos grandes emoções durante a aventura;
conhecemos muitos lugares, pessoas simples e sempre dispostas a ajudar. Foi
muito legal, e sabia que um dia voltaria lá. Essa viagem fez parte de outro
texto meu, que um dia publico.
Voltei ainda no mesmo ano, no mês de setembro. Conversando
com o compadre Rubens, que gostaria de ter nos acompanhado na primeira empreitada,
mas tinha compromissos, ele disse que estaria livre no mês de setembro, e
queria fazer uma cicloviagem. Como tinha férias atrasadas, lá fui eu...
Perguntei para onde queria ir, e ele ficou envergonhado de dizer que gostaria
de fazer o CEPIMA (Ceará, Piauí e Maranhão – A Rota das Emoções), pois eu
acabara de estar lá. Disse a ele que toparia fazer tudo de novo. Ele ficou
alegre e acertamos o roteiro.
O mês de setembro apresenta ventos fortes, os alísios, que
sopram de leste para oeste. Assim, fazer de São Luis para Fortaleza seria um
suplício. Optamos o contrário; e valeu à pena. Pode-se dizer que criamos, a
partir dali, esse roteiro, que sai num domingo de Fortaleza, e termina dois
domingos depois, em São Luís. O tempo curto se deve a pouca disponibilidade
desse recurso, à época, mas demonstrou ser o suficiente para o cicloturismo.
O roteiro inicia na praia de Iracema, em Fortaleza, segue
direção oeste, cruzando a ponte sobre o rio Ceará, passando por bairros de
Caucaia, até chegar à praia do Cumbuco, famosa por possuir lindas dunas, onde
os bugues levam turistas para passeios com ou sem emoção...
É momento de deixar o asfalto e seguir pela areia das praias.
Passa pelo porto de Pecém, depois Taíba e Paracuru. Pausa para a areia e
sequencia por estrada de chão até Paraipaba; asfalto até a linda praia de
Lagoinha. Mais lindas praias: Guajiru, Fleixeiras e Embuaca, que pertencem ao
município de Trairí. Depois Mundaú, praia da Baleia, Inferno, Pracianos,
Apiques e Icaraí de Amontada. Patos, Torrões e a antiga cidade de Almofala, que
teve seus edifícios cobertos pelas dunas. A Igreja de São Sebastião ficou
coberta também, mas a curiosidade é que 43 anos depois, o ventou levou a areia
e ela apareceu graciosa, e está lá até hoje...
Pela estrada chega-se a Itarema, Juritianha, Acaraú, Cruz e
Aranaú, novamente à beira mar. Dali chega-se à encantadora Jericoacoara, depois
Camocim, passando antes Mangue Seco, Guriú e Nova Tatajuba (nova porque a
antiga também foi consumida pelas dunas, restando poucas ruínas). O estado do
Ceará faz divisa com o Piauí no município de Chaval. Por estrada chega-se às
primeiras praias do pequeno litoral piauiense. Nosso destino é a praia de
Coqueiro, depois a cidade de Luiz Xavier, para então chegar a Parnaíba, cidade
do grande rio que tem sua foz no oceano Atlântico, formando um dos maiores
deltas do planeta.
O roteiro atravessa o delta de barco até a cidade maranhense
de Tutóia. De lá segue-se até Paulino Neves, já nos “Pequenos Lençóis”. Pela
praia chegamos a Caburé, na barra do rio Preguiças. Do outro lado do rio já
ficam os famosos Lençóis Maranhenses, mas o acesso principal é por
Barreirinhas, subindo o rio por 40 km. Por estrada seguimos em direção a São
Luis, a capital do Maranhão.
O percurso deu tão certo, que disse ao Rubens que um dia
levaria um grupo de amigos para percorrê-lo. Dois anos depois propus isso a
algumas pessoas e, aceitaram. Formamos um grupo de 10 cicloturistas e partimos
no mesmo mês de setembro, porém em 2010. O relato dessa aventura se encontra
registrado minuciosamente no blog cepimapa.blopgspot.com. Quer saber o por quê
do “PA”. Eu e a Carmo resolvemos continuar a expedição até o Pará, mais
precisamente Belém, a capital. Foram mais 800 km, e mais 15 dias de pedal. O
percurso até São Luís tem mais ou menos o mesmo tanto.
A quarta vez veio no ano passado, 2013, quando eu, a Carmo e
outros cinco amigos fizemos a rota novamente. Tudo bem documentado aqui mesmo
neste blog.
Agora estou aqui de novo, feliz em poder dividir essas
maravilhas com os amigos. Dou a ideia e eles aceitam... Ficam sabendo
previamente dos “perrengues” que passarão, mas mesmo assim fazem questão de
conhecer a famosa Rota.
Estamos neste ano de 2014, em oito pessoas, todas de
Curitiba: o Neimar (que esteve na expedição anterior), o Nascimento, o Juliano,
o Fabio, o Wendell, o Sergio Benthien, a Carmo e eu. Todos os grupos tem seu
“temperamento”, e esse não é diferente. Adultos, experientes, profissionais de
carreiras diversas, e que devem, como premissa, deixar o individual para seguir
o coletivo. Tarefa nem sempre fácil. Mas procuro sempre conduzir o grupo e o
passeio de forma que todos se sintam bem, e curtam muito a aventura.
Diferente do ano passado, quando passamos por algumas
dificuldades, principalmente por alterações nas marés, este ano as coisas estão
indo muito bem. A maioria dos participantes chegou a Fortaleza ainda na sexta
(apenas o Juliano chegou sábado à noite). Tivemos o sábado inteiro para passear
pela cidade; de bicicleta, é claro. Ali começou a boa integração e interação.
Poucos conheciam a cidade, e tudo foi muito aproveitado, principalmente a bela
praia do Futuro. Deu tempo de curtir o por do sol, num dos famosos trapiches da
cidade.
FORTALEZA a LAGOINHA
Estudando a tábua das marés, pedi a todos para sairmos cedo.
Pouco depois das sete já estávamos rodando. Passei, de propósito pelo centro
antigo de Fortaleza, pela Catedral e Mercado Central. Naquele horário havia uma
muvuca só pelas ruas; muitas pessoas circulavam para lá e para cá; barracas e
vendedores espalhados por tudo quanto é canto, inclusive nas ruas, que ficavam
estranguladas. Descobrimos logo em seguida, que se tratava de uma feira, e na
verdade já estava terminando, pois havia começado no sábado de noite...
Percebemos em seguida uma série de ônibus de sacoleiros estacionados na
imediação.
A sequencia foi sossegada, sempre com o vento a favor, que,
como disse, bate forte nessa época do ano. Perto de Cumbuco, no momento em que
deveríamos seguir pela areia da praia, um pneu da minha bicicleta furou.
Primeira coisa é reconhecer onde furou. Não furou, foi o remendo de furo
anterior, que, aquecido pelo asfalto, escorreu pela câmara e aumentou seu
tamanho (câmara perdida). Tratava-se da câmara que remendei na noite anterior,
logo após o primeiro furo acontecer, quando passeávamos por Fortaleza. Comecei
a ficar preocupado em atrasar os meus planos...
O primeiro contato com a areia das praias de Cumbuco foi
muito bom. Senti todos muito animados e felizes por estarem ali, praticamente
começando a jornada por caminhos que, para alguns, era novidade. A maré
correspondia e deslizamos ao sabor dos ventos. Juntos, depois de alguns
quilômetros, logo após passarmos pela lagoa do Cauípe, deixamos a praia e
seguimos por estrada que naquele ponto fica paralela, e leva até o Porto de
Pecém (o trecho de praia contém muitas pedras, e mesmo com maré baixa, há
alguma dificuldade para transpor).
Justamente nessa transição, o pneu da minha bicicleta furou
novamente. Não encontrei qualquer material cortante ou perfurante; troquei a
câmara rapidamente e seguimos.
Passamos por baixo do trapiche do porto, pela areia da praia,
observando o movimento fantástico das ondas avançando sobre as colunas de
sustentação. Chegamos à praia de Taíba com 60 km rodados e paramos para
hidratação. A maré continuava favorável. Dali para a bela praia de Paracuru foi
um “pulo”. Almoçamos no restaurante de parada dos aficionados por Kite Surf e
resolvi seguir pelo asfalto até a cidade, pois a maré já estava enchendo. Final
da tarde e já havíamos percorrido toda a estrada de chão que leva à cidade de
Paraipaba. Dali para a frente, com faróis acesos, todos bem próximos uns dos
outros, por segurança, alcançamos a cidade destino do dia: Lagoinha. Estávamos
novamente no litoral, e percorremos 104 km no dia.
Alguns estavam mais cansados do que outros, talvez pela falta
de costume, pelo sol forte durante o dia todo ou até mesmo pela forma de se
alimentar ou se hidratar. Os organismos respondem de forma diferente em cada
pessoa. A verdade é que senti, pelos comentários, que todos gostaram desse
primeiro dia. Solidários, cada um procurou ajudar o grupo no que pode. Teve
quem se encarregou de lavar as bicicletas e outros foram fazer compras para o
café da manhã.
LAGOINHA a ICARAÍ DE AMONTADA
Previsão de maré correta, e não precisamos deixar a pousada
pela madrugada. Pudemos curtir um pouco das belezas da praia de Lagoinha.
Seguimos felizes pelas areias da praia, sem muita dificuldade. O rio, cerca de
10 km depois, que costuma fazer com que se use balsa para atravessá-lo, estava
com água pelas canelas, e foi transposto rapidamente e com segurança. Pouca
dificuldade e logo chegamos a Guajirú. Apesar de por ali passar uma estrada,
resolvi seguir pela praia, pois as condições estavam boas; deixei para subir à
estrada já no final da praia de Flexeiras, quando paramos para hidratação.
Agora pelo asfalto, passamos por Embuaca e chegamos a Mundaú.
Seria o momento do almoço, mas preferimos apenas fazer um lanche. Vale lembrar
que eu e a Carmo preparamos sanduíches pra todos, pela manhã, do que sobrou do
café da manhã. A medida foi acertada, pois teríamos muitos quilômetros pela frente,
e deveríamos enfrentar o “pesadelo do cemitério”. Trata-se de um trecho em que
a areia da praia fica estreita pela
presença de rochas. A faixa de areia acima dessas pedras é extremamente fofa,
impossível de se pedalar. A curiosidade
é que existe um cemitério aberto, sem muros, à beira da praia. Muitos parceiros
das edições anteriores “morreram” ao passar esses 4 km... (rs). Empurrar
bicicleta pesada... ninguém merece.
Felizmente todos se saíram muito bem, e mesmo cansados,
estavam felizes. Na metade desse trecho ruim, largamos as bicicletas e nos
deliciamos com um banho refrescante no mar. Chegamos antes das duas horas na
Pousada de Icaraí de Amontada; pedimos o almoço, que é do mesmo proprietário e,
antes de sermos servidos, procuramos fazer a necessária limpeza das bicicletas.
O resto do dia ficou livre para descanso, banho de mar, etc. Pedalamos 75 km.
ICARAÍ DE AMONTADA a ACARAÚ
Por estrada de chão seguimos até o rio Aracatiaçú, na vila de
Moitas, para pegar um barco até a barra do rio, na sua margem esquerda. O
barqueiro não estava e nos orientaram a pegar outra balsa, mais acima, que nos
deixaria à beira de uma estrada, que por sua vez sairia na vila de Patos. De lá
poderíamos seguir pela praia até Torrões, atravessar outro rio, ou continuar
pela estrada de chão até uma pista de asfalto. Nesse caso, não passaríamos por
Almofala, mas sim seguiríamos direto para Itarema, mais à frente.
Orientados por alguns meninos locais, que também circulavam
de bicicleta, chegamos até a outra balsa. O caminho apresentava algumas
surpresas, boas, como as belas dunas que praticamente se estendiam até às
margens do rio Aracatiaçú. A presença de usinas Eólicas, que apesar de suas
torres imensas, dão uma imagem bacana com as suas hélices brancas girando ao
sabor dos ventos. Parecia uma “plantação de ventilador gigante”.
Do outro lado seguimos as orientações e tempo depois já chegamos
a Patos. Em alguns instantes decidi por não enfrentar um longo trecho de mangue
até a barra do rio, do qual já conhecia; preferi continuar por estrada de chão
até o asfalto. Preteri Almofala, mas ganhava em tempo e disposição do grupo.
Pelo menos por uma coisa valeu muito à pena essa alternativa:
ao chegarmos ao povoado de Barbosa, o Nascimento fez contato com alguns
moradores de uma casa, e logo todos chegaram e foram até a varanda. Fomos
extremamente bem atendidos pela Dona Rosa, sua filha Rosalina, seu marido
Manoel, que prefere ser chamado de Gerson (ou Jésso, conforme a pronúncia), o
menino Darkson, além dos demais familiares. Primeiro nos serviram água gelada;
logo já estávamos dentro da casa, e seu Manoel, junto de seu filho, nos levou
aos fundos da casa para servir coco, que plantava em seu terreno. Com um longo
pau feito de bambu e uma espécie de foice na ponta, se embrenhou no meio da
plantação e encontrou seus melhores cocos. No caminho ainda catamos tamarindo e
experimentamos seu sabor. Ali mesmo nesse quintal, abriu os cocos e nos deu
para beber; depois ainda os partiu para comermos a polpa interior.
Seu Manoel, na sua simplicidade, disse que gosta de servir,
pois um dia poderá necessitar de ser servido. Demonstrou estar triste por não
poder produzir todos os alimentos para a família, por sua precária saúde,
fazendo com que agora precise comprá-los. O médico que o atendeu murmurou
grosseiramente que ele precisava parar de beber; coitado, ele não bebe...
Vimos, também, dona Rosa preparando uma tapioca... Suas filhas, depois de um
tempo menos envergonhadas, pousaram para algumas fotos; como toda família
moderna, já estavam conectadas na internet e nas redes sociais. Deixamos o
endereço do blog para elas acompanharem. Muita saúde, paz e prosperidade a essa
querida família.
Era preciso continuar. Tempos depois, cansados pelo sol e
estrada de pedras, chegamos ao asfalto, onde pudemos nos hidratar novamente. Em
Itarema almoçamos, e depois de 72 km percorridos no dia, chegamos a Acaraú,
nosso destino para pernoite.
ACARAÚ a JERICOACOARA
O conhecimento da maré se fazia necessário novamente. No ano
anterior passamos por um perrengue danado, quando tivemos que empurrar as
bicicletas pela areia fofa, por cerca de 10 km. Não queria e não iria cometer o
mesmo erro. Deixamos a cidade de Acaraú por volta das 08:15, porém, houve um problema
nos freios da bicicleta do Neimar, tendo que passar numa bicicletaria para
reparos. Pedi para a turma seguir na direção de Cruz e esperei junto com o
Nascimento. Depois soubemos que não deu certo, e ele teve que soltar os freios
para não travar as rodas.
Alcançamos o grupo na entrada para Aranaú, logo após Cruz.
Nessa estradinha, alguns pararam para apanhar e comer o caju, fruta muito
saborosa e refrescante, comum na região; um manjar. Reagrupados em Aranaú, nos
hidratamos, comemos alguma coisinha e partimos decididos para a praia, e não
perder a maré. Deu tudo certo, felizmente. A estratégia desta vez, de não
almoçar em Preá, foi boa, mesmo porque ainda era cedo, menos de meio dia. Pela
frente agora “apenas” a árdua tarefa de subir o morro do Serrote, atravessá-lo
e chegar até Jeri.
Paramos no Preá apenas para beber umas cervejinhas, pois
ninguém é de ferro (rs), voltamos para a areia e seguimos bem tranquilos, com
maré bem baixa, até o morro. Infelizmente nem tudo acabou certo. Quando nos
preparávamos para subir, o Fábio parou com sua bicicleta, que não andava mais.
Era seu câmbio traseiro, que, de alguma forma, torceu inteiro e ficou enroscado
num dos raios. Com a ajuda do Nascimento, tentamos reverter o quadro, mas o que
estava ruim ainda podia ficar pior: a gancheira do câmbio quebrou. Fim de
linha! Mais ou menos. Prendemos o “macaquinho” no quadro, liberando a roda para
pelo menos ser empurrada morro acima e servir de apoio na descida, até a vila
de Jeri. Conseguimos. Perto de duas horas da tarde, depois de 57 km rodados,
chegamos.
Jericoacoara é muito charmosa, frequentada por turistas do
mundo inteiro; tem muitas pousadas e restaurantes de cozinha internacional.
Porém ninguém pedala por aqui, pois as ruas são de areia fofa. Resultado: não
tem bicicletaria. Só em Jijoca, mas o acesso é mais complicado. Como tudo tem
um jeito, teremos que deixar a bicicleta tipo “fixa”, e na próxima cidade
maior, acredito que em Camocim, na sexta-feira, conseguiremos um câmbio novo.
Depois de fazermos um “almojanta” fomos até a famosa duna Por do Sol, para
apreciar o sol se pondo. É sempre um espetáculo...
Fazer Bicicleterapia neste local é tudo de bom!
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