TRILHA DO
TELÉGRAFO
Em abril de 2012 resolvi percorrer, sozinho, de bicicleta, a
famosa Trilha do Telégrafo, na Serra do Mar, na divisa dos Estados do Paraná e
São Paulo. Amigos já haviam realizado, em grupo, esse feito na década de 90, e
a aventura é lembrada até hoje, não só pela dificuldade de passar pela trilha,
que estava toda enlameada, mas também pelo vento forte que soprou contra,
enquanto tentavam deslizar pelas praias do Lagamar.
Estava de férias, e quando o amigo Heron Mathoso, do grupo
NatureARlivre resolveu fazer um passeio a pé naquela região, não tive dúvidas:
é a oportunidade de percorrer a famosa trilha.
Saí dia 18 de abril, uma quarta-feira, em direção a Antonina,
80 Km adiante. Dia maravilhoso para pedalar, e é claro que escolhi o caminho
pela estrada da Graciosa. Infelizmente no mirante do alto da serra, o tempo
ficou encoberto, e a vista do litoral não estava tão deslumbrante como costuma
ser.
Pela primeira vez, depois de “trocentas” vezes que desci aquela
encantadora serra, furou o pneu, no trecho de paralelepípedo; em alguma
oportunidade de subida, isto já havia acontecido. É comum furar pneu de
bicicleta, mas fiquei surpreso de acontecer naquela descida. Nada sério. Segui
meu rumo até Antonina, onde me hospedei num confortável Hotel, perto da velha e
quase abandonada estação de trem da cidade; precisava estar bem descansado para
o trecho puxado até Guaraqueçaba, no dia seguinte.
Diferente da vez anterior, quando fui à Guaraqueçaba com o
amigo Manuel, não estava tão quente naquela quinta-feira, e não foi tão
exaustivo o trecho até lá. As pedras, as subidas e a beleza do lugar ainda
estavam por lá... Assim mesmo foram 97 km de pedaladas. No caminho descansei de
novo à beira do rio Tagaçaba, onde há dois restaurantes, um em cada lado; escolhi
o da direita.
O próximo desafio era subir a pequena, mas “derrubadora”
serrinha, chamada de “Negra”. Sorte que há uma bica, quase chegando ao topo,
sendo possível dar uma refrescada gostosa. Um mirante bacana, todo branquinho
está lá isolado, logo após, chamando a gente para subir suas escadarias e
apreciar a bela vista da baía. Exatos 15 km antes de chegar à cidade, passei
pela entrada da reserva ecológica do Salto Morato, da empresa “O Boticário”.
São mais 5 km estradinha adentro para quem quiser conhecer a cachoeira.
Passei direto. A 3 km pra frente chegava à entrada para a
trilha do telégrafo; seria só virar à esquerda e seguir mais uns 17 km para
chegar ao povoado de Batuva, ainda no Paraná, onde começa verdadeiramente a
trilha.
Passei direto, de novo. Achei mais prudente, pelo horário,
sem saber o grau de dificuldade e a distância exata, seguir até Guaraqueçaba,
dormir por lá, e no dia seguinte retornar àquele ponto. Foi o que fiz. Dali até
a cidade foram mais 12 km. Cheguei ao final da tarde. Noite agradável; permaneci
na praça, à beira mar; fiz um lanche, e fui para o aconchego do hotel.
Confesso que não levantei muito cedo, e lá pelas 09h00 peguei
a estrada de volta àquele ponto, para o povoado de Batuva. Era uma sexta-feira
ensolarada, mas não estava muito quente; perfeito para pedalar. O começo da
estradinha me deixou confiante para um passeio sossegado, mas foi só andar mais
um pouco que as dificuldades apareceram: pedras no caminho. Se eu fosse um
poeta recolheria e construiria um castelo, mas como sou um ciclo turista,
precisava mesmo é passar por cima delas... Pelo menos não havia muitas subidas,
era até tranquilo nesse aspecto.
Chegando à comunidade de Batuva, parei num mercadinho e bar,
provavelmente o único do lugar. Aproveitei para me hidratar e conversando com o
proprietário, ele me informou que poderia ter dormido por ali, pois existe uma
pequena pousada, inclusive de um familiar seu. Como cheguei tranquilo a
Guaraqueçaba, que estava a 12 km daquele ponto da estrada, poderia também chegar
até lá, com apenas 5 km a mais. Mas o que está feito, está feito.
Agora era a hora de conhecer definitivamente a “temida”
trilha do telégrafo. O começo foi
sossegado, parecia apenas uma simples estradinha, mas foi pedalar uns 200
metros e já tive que apear. E assim foi, ou seja, “empurrabike” – pedala, mais
o primeiro do que o segundo, claro. Mas é gratificante; o silêncio, a paz e
liberdade encontrada ali, sozinho; é fantástico. Não havia lama; as poças
estavam secas, parecendo leito de rio seco. Às vezes tinha pequena trilha
“pedalável”, mas na maioria do tempo eram pedras e pedras; barrancos e pequenos
riachos. Difícil tirar fotos, porque para isso deveria parar, e esse ato
representava ser atacado por insetos vampiros.
Transpor a mata atlântica, passando do Paraná para São Paulo,
de bicicleta, sozinho, é uma experiência única. Talvez não consiga descrever
mais, de tão simples e pitoresco ao mesmo tempo. Cheguei ao pequeno rio e vi
dois troncos de árvore estendidos para a outra margem; fiquei imaginando como
transpor esse obstáculo, pois eram estreitos e estavam soltos, e certamente se
moveriam; a queda era certa. A cena seria a seguinte: eu de um lado, a pé, e a
bicicleta do outro, no outro tronco. Fácil entender? Não vou desenhar.
Brincadeira.
É claro que tinha um plano “B”: descer mais ao lado, alguns
metros, por um barranco. Fui. Escorregando, é claro, mas desci. Fiz um
“passeio” pelo rio, sem me importar em molhar as sapatilhas, que naquela altura
já estavam ambas melecadas mesmo. Acontece que do outro lado da margem tinha
uma trilha, e estava certo que era a correta, mas logo vi a encrenca, pois
chegava a uma cerca de arame farpado, e não tinha para onde ir. Voltei alguns
metros até o rio, entrei de novo, fiz um novo “passeio” até encontrar a sequencia,
que na verdade praticamente era a continuação da “ponte”; burrinho eu, né? Só
podia ser ali, mas estava tão interessante aquela outra trilha...
Continuei. Passei pela (acho) única propriedade do lugar,
onde havia algum tipo de habitação, e provavelmente era a responsável por
aquela cerca. Era uma região plana, mas continuava a tatear o chão para
encontrar a melhor forma de atravessar, e empurrando a bike, até chegar num
retão.
Tinha uma “luz no fim do túnel”. Era a visão de um ônibus;
não era só uma visão, era um ônibus. Ficava pequeno de longe. Nessa reta pensei
que poderia pedalar, e chegar logo ao ônibus. Sabia que ali ficava a Escola do
lugar chamado Santa Maria, à beira do rio Taquari, ou seja, fim da trilha do
telégrafo, já no Estado de São Paulo. Olhando no sentido da Escola, o piso
parecia até perfeito, mas era feito de troncos, (mal) alinhados como numa linha
de trem, transversalmente. Eram arredondados, acho que feitos de bambu ou
pequenos troncos mesmo de madeira, e existia uma diferença grande entre eles, o
suficiente para impedir o pedal, pois nesse meio o barro estava presente.
Ilusão de ótica...
Seguir por aquela “costela de vaca” era até “irritante”
(longe disso, eu estava era muito sossegado); então, na maior parte do tempo,
segui pelo lado, enfrentando o mato e o barro seco, às vezes um pouco em forma
de lama. Fiquei imaginando aquele lugar encharcado... Aventura pura!
Enfim cheguei à escola, e logo depois à vila, que fica um
pouco mais distante, talvez 2,5 km, onde parei para me hidratar e comer alguma
coisa. Ali existe uma pequena estrutura para dormir também, caso alguém precise
disso. Mais 5 km e chega-se à estrada que liga o povoado de Ariri, - no
Lagamar, à beira do canal que separa os Estados de São Paulo e Paraná, sendo
que no lado do Paraná, observa-se o povoado em ruínas do Ararapira, na ilha de
Superagui -, com o povoado de Itapitangui.
Dali até Itapitangui foram mais 35 km, passando pela reserva
extrativista do Mandira. Trecho difícil, numa estrada de chão de pedras, valetas,
subidas e descidas, e, às vezes, muita lama. Num dos trechos, trabalhadores com
grandes caminhões, “melhoravam” o piso colocando uma grande quantidade de
pedrinhas. Resultado: impossível de pedalar sobre elas. Pensei que era um
pequeno trecho, mas chegava a 2 km. Parece pouco, mas vai fazer... Às vezes
encontrava espaço na beiradinha, no leito antigo da estrada; outras, empurrava
sofregamente por cima das pedrinhas.
Cheguei a Itapitangui, procurei um bar para me hidratar e
depois segui até Porto Cubatão para pernoitar. Foram apenas mais 5 km.
O dia seguinte serviu para relaxar. Pedalando, claro. Fui até
Jacupiranga, às margens da BR 116, 32 km, por estradinha de chão, encontrar o
grupo do Heron, que faria a caminhada até a cachoeira do Pitú. No tempo certinho
encontrei o grupo deixando a cidade para pegar a estradinha de chão. Embarquei
no ônibus e pude ficar perto da minha mulher Carmo, que fazia parte do grupo, e
que não pode fazer a jornada de bike comigo, por outros compromissos na semana.
O passeio começou 20 km em direção ao litoral. Também desembarquei com a bike,
e segui com o grupo, que estava a pé, aproveitando para virar um fotógrafo
volante.
Aproveitamos as belezas e a delícia das águas geladas do rio
e da cachoeira do Pitú, para depois, embarcados, seguir até Cananéia para
jantar. Cananéia fica numa ilha do Lagamar, e é uma das cidades mais antigas do
país; lembra um pouco, pelo casario à beira do canal, as nossas Morretes,
Antonina ou Paranaguá.
Show!
Muito bacana o passeio e o relato.
ResponderExcluirTô planejando fazer Floripa-RJ de bike no próximo verão. Quero desviar da RegisBit, recomendaria essa trilha pra alguém no meio de uma viagem de 1200km?
Abração e valeu pelas informações.
Já fiz essa loucuras 4x,saindo de Paranaguá até Iguape, e todas as vezes no meio do caminho jurava q nunca mais faria tal loucura,mas chegando sempre no começo de julho,a vontade voltava de novo rsrsrs,sofrido,mas muito gratificante no final,parabéns pelo relato,hj com 47 anos ainda tenho vontade de voltar a fazer essa trilha,mas com uma equipe Boa,abraços
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