TERESINA
22 a 25 de
Setembro/2013
O Val nos convenceu, e
continuamos com o grupo dele. Ele prometeu nos deixar em Peritoró, também no
Maranhão, o local mais próximo à Teresina, no Piauí, nosso último destino.
Deixamos Carolina para
trás, vislumbrando ainda, mesmo no final da tarde de sábado, as belezas
naturais da Chapada das Mesas. A estrada (BR 010) estava tranquila, sem muito
movimento, e as camionetes imprimiram uma boa velocidade.
Passamos pela cidade de
Estreito (MA) e Porto Franco (MA), e margeamos Tocantinópolis (TO), todas ficam
à margem do rio Tocantins, que divide os estados do Maranhão e Tocantins. Foi
ali que o Val parou num posto de gasolina e perguntou a todos se queríamos
pernoitar por ali, e se aguentávamos mais um trecho, até Grajaú. Todos
concordaram em seguir, pois estaríamos cada vez mais perto do destino, deixando
a viagem do domingo mais sossegada.
Pegamos a BR 226 à
direita e seguimos mais 150 km até lá. Dos parques de Carolina até Porto Franco
foram mais de 100 km. Chegamos por volta das 20h30 e logo procuramos um local
para pernoite, à beira da estrada, um Hotel bem confortável. Depois de um bom
banho seguimos em grupo até uma espécie de praça da alimentação, com comidas
típicas. O Val insistia em comer tatu. Confesso que fiquei feliz por ele não
ter encontrado; não sei se conseguiria comer – não estou acostumado. Procuramos
outros pontos de comida, e acabamos nos separando, pois o grupo dele foi a um restaurante,
de um lado da estrada, e nós três seguimos para o outro, numa pizzaria.
O domingo amanheceu,
para variar, muito quente. Logo pegamos a estrada. O visual era o mesmo:
cerrado e mais cerrado. Até que chegamos à região de uma reserva indígena. Conflitos
entre índios e brancos existem em todos os lugares do Brasil, todos nós
sabemos. O governo tenta fazer o possível, ou talvez não, para resolver as
questões fundiárias, e delimitar áreas de reservas. O problema é que essas
regiões às vezes se tornam perigosas; transitar por essas rodovias, de noite,
nem pensar, dizem os experientes.
Ocorre que num
determinado momento, justamente quando entrávamos na reserva, o asfalto, que
até então estava lisinho, bem cuidado, passou a ficar completamente esburacado.
Percebemos em seguida, que o poder público não consegue gerir o problema. Só
havia visto a cena em documentários na televisão, e achava que era pontual, e
que isto não existia mais. Estou falando de duas coisas feitas pelos índios, a
fim de conseguirem algum dinheiro, como um “pedágio”: primeiro, alguns pequenos
índios, homens, com pás, cobriam alguns buracos para facilitar a passagem dos
automóveis, e lá vinha o pedido de dinheiro (logo em seguida provavelmente
abriam o buraco novamente, para o próximo incauto); segundo, grupo de mulheres,
meninas e outras crianças, esticavam barbantes, com alguns penduricalhos, de um
lado ao outro da estrada, provocando a diminuição da velocidade e novamente o
pedido por dinheiro. Separamos muitas moedas, e por alguns quilômetros fomos
distribuindo em cada barreira dessas.
Quando a coisa ficou
mais tranquila, o Val perguntou se queríamos conversar com os índios. Nem
respondemos e ele parou no acostamento, sendo acompanhado pela camionete do
Cleydson. Uma pequena barraca estava lá, sem ninguém, com alguns objetos de
artesanato confeccionados pelos indígenas. Logo um grupo de senhoras saiu do
fundo do terreno, onde havia uma casa, e correu para nos receber. Depois de
olhar alguns utensílios, apenas a Gorete comprou algo.
Enquanto as mulheres do
nosso grupo viam os objetos, nós, homens, observamos ao fundo, ao lado da casa,
um grupo de indígenas com espingardas e revólveres. Felizmente estavam apenas
testando suas miras em algumas latas. Mas que o estampido dos tiros assustou,
assustou.
Continuamos a viagem e
logo chegamos a Barra do Corda. Corda é o nome do rio que passa pela pequena
cidade, e barra, porque o rio deságua justamente naquele ponto no rio Mearim.
Encontramos um lugar para fazer um aperitivo e seguimos até a casa da avó da
Betania. Lá a família dela foi muito receptiva e chegou a oferecer um almoço.
Alguns comeram um pouco de guisado e voltamos para a estrada.
Famílias se divertem no rio do Corda |
Lanche à beira do rio do Corda |
Val e família |
Rio do Corda desaguando no Mearin |
Poucos quilômetros
depois paramos em Presidente Dutra, outra pequena cidade da região central do
Maranhão. Paramos para visitar outros parentes de nossos condutores. Nos fundos
da casa simples havia uma criação de pequenas tartarugas. Bebemos água e
refrigerante e, antes de sair da cidade, deu tempo de chupar um bom sorvete
caseiro e comprar rapadura, servida em pequenos tabletes, fácil de degustar.
"Sossegada" Presidente Dutra... |
Sossegada Presidente Dutra |
Na forma prometida, o
Val nos deixou em Peritoró, pouco menos de 200 km de Teresina. Naquele ponto, a
BR 135, onde circulávamos, encontra a BR 316. É uma confluência muito agitada,
embora o lugar seja bem pequeno. Na estação de ônibus, percebemos que teríamos
várias opções de locomoção até a capital piauiense. Depois de alguns acertos
daqui e dali (o funcionário e o motorista queriam ganhar um “trocado” extra
para levar as bicicletas – é claro que não caí nessa), escolhemos nosso ônibus
e embarcamos, não sem antes comprar alguma coisa para beber e comer durante o
trajeto. É preciso dizer que toda a família do Val nos acompanhou para
despedida; eles foram sensacionais conosco, e nos proporcionaram conhecer um
pouco do costume regional. Temos muito a agradecer.
Digo, também, que não
fizemos esse trecho pedalando, por absoluta falta de tempo. Nosso avião
partiria na quarta-feira, dia 25 de setembro, e estávamos no domingo, 22. Não
conheceríamos Teresina, nosso objetivo. Percebemos, por outro lado, que esse
trecho é extremamente deserto, de paisagem monótona e acostamento complicado,
sem contar o calor sufocante. Foi uma medida segura, acredito.
Ainda dentro do ônibus,
conversando com outras pessoas, sabendo que queríamos ir até o centro da
cidade, nos disseram que era melhor descer antes de passar a ponte, em Timon,
do lado do Maranhão, pois a rodoviária de Teresina era mais longe. Foi o que
fizemos. Desembarcamos, montamos as bicicletas e seguimos uma avenida de duas
pistas, com pouco movimento e logo chegamos à antiga e bonita ponte de ferro
que atravessa o rio Parnaíba e separa os dois estados.
Já estava noite e
quando chegamos ao centro da cidade, percebemos o quanto estava deserto. O
centro, como na maioria das grandes cidades, é a parte antiga, sem muitas
residências, apenas comércio, justificando a ausência de pessoas, ainda mais no
domingo. Chegamos a um pequeno hotel, mas como o preço passava do nosso
“bolso”, o próprio atendente indicou outro, mais em conta, perto de uma das
principais praças da cidade. Lá nos abrigamos. Dali, teríamos como explorar
todas as regiões da capital.
Fizemos isso. Logo de
saída, na manhã de segunda, passamos pedalando pelo Palácio de Karnak,
imponente e bela sede do governo estadual desde 1926. Antes era um palácio
imperial. Em seguida, logo ao lado, a Igreja de São Benedito, cuja obra foi
iniciada por franciscanos em 1874 e terminada doze anos depois. É um dos três
principais templos católicos da cidade; os outros são a Igreja de Nossa Senhora
das Dores e a padroeira Catedral de Nossa Senhora do Amparo.
Continuamos pela
principal avenida do centro da cidade, a Frei Serafim, e atravessamos a ponte
Juscelino Kubitschek, sobre o rio Poty, também chamado de Poty Velho. Do outro
lado do rio já se vê uma cidade mais moderna, com um belo Shopping na avenida
que beira o rio, a famosa Raul Lopes. Aliás, há não muito tempo atrás, fizeram
uma bela ciclofaixa, rigorosamente pintada de vermelho, estreitando o espaço
para os outros veículos. Interessante que no dia da chegada à capital, vimos no
noticiário local, muitos motoristas de carro e motociclistas sendo multados por
trafegarem pela ciclofaixa. Depois, pela cidade, vimos campanha de
conscientização no trânsito. Aproveitando, o trânsito é bem complicadinho;
mototaxistas brigam constantemente com motoristas e os acidentes se proliferam,
tanto é que presenciamos um.
Rio Poty |
Circulamos depois pela
região sul, até chegarmos à beira do rio Parnaíba. Interessante encontrar
novamente esse rio, mais acima, posto que serpenteia entre os dois estados, por
quase quatrocentos quilômetros até formar o majestoso delta. Pedalamos então
pela Avenida Maranhão, quando chegamos à Ponte Velha, metálica, aquela que
atravessamos na chegada: Ponte João Luiz Ferreira. Levou 17 anos para ser
construída, e foi inaugurada em 1939. Agora de dia, deu para ver sua
imponência. Cruzamos até Timon e voltamos, isso para aproveitar a vista de
Teresina.
Aproveitamos que
estávamos na região de muito comércio, e procuramos por caixas de bicicleta,
para acondicioná-las, já pensando no retorno. Encontramos e carregamos de forma
desengonçada até nosso hotel. Depois voltamos à beira rio para almoçar.
Interessante observar que o pessoal aproveita a água do rio para lavar todo
tipo de veículo, inclusive ônibus. Provavelmente a gurizada que fica por ali
cobra uma taxa, e a calçada fica uma lambança só; confesso que não é nada agradável
ver aquilo.
Final da tarde, e a
opção de passeio é de seguir até o encontro dos rios Poty e Parnaíba, quando o
primeiro se lança no leito do segundo, junto a um belo por do sol. Interessante
foi encontrar ali a estátua do “Cabeça de Cuia”. Demos algumas risadas com
isso, porque durante nossa expedição, alguns brincavam com o Neimar, o chamando
de “Cabeça de Cuia”. No final, fomos conhecer o “verdadeiro”. É claro que ele
não gostava das brincadeiras, mas tudo bem; sobreviveu...
“Cabeça de Cuia é uma lenda da região nordeste do Brasil, mais
precisamente criada no estado do Piauí.Trata-se
da história de Crispim, um jovem garoto que morava nas margens do rio Parnaíba. Sua
família era necessitada. Um
certo dia, chegando para almoço, sua mãe lhe serviu, como de costume, uma sopa rala, com ossos, já
que faltava carne na sua casa frequentemente. Nesse dia ele
se revoltou, e no meio da discussão com sua mãe, arremessou o osso contra ela,
atingindo-a na cabeça e matando-a. Antes de morrer sua mãe lhe
amaldiçoou a ficar vagando no rio e também como efeito da maldição, Crispim
ficou com a cabeça muito grande, no formato de uma cuia, daí o
nome "cabeça de cuia". A mãe ainda lhe disse que sua perna penduraria
até que ele se relacionasse sexualmente com sete Marias virgens. Dada essa
lenda, muitas garotas antigamente evitavam lavar as roupas às
margens do Rio Parnaíba.
A Prefeitura de Teresina instituiu, em 2003, o Dia
do Cabeça de Cuia, a ser comemorado na última sexta-feira do mês de abril.” (fonte: Wikipédia)
Encontro dos rios |
Aproveitamos o último dia disponível,
terça-feira, para passear de bicicleta em Teresina. O calor era impressionante,
e em certo momento, perto do meio dia, o termômetro da rua marcava 40°. Poucas
pessoas se arriscam a fazer exercícios nesse horário, e, de bicicleta, só
encontramos com guardas do batalhão ambiental.
Passamos pela Central de Artesanato Mestre Dezinho, um local
que além de vender produtos originais, conta muito da história do Piauí. Continuamos
pelo centro até chegarmos ao bairro de nome esquisito: “Porenquanto”. Dali foi
um pulo, ou melhor, uma pedalada, até a linda Ponte Estaiada Mestre João
Isidoro França. Do outro lado do rio Poty há um elevador que leva até o alto da
torre, onde existe um mirante 360°, sendo possível admirar e conhecer melhor
toda a capital piauiense. Subimos e observamos tudo rapidinho. É que o tempo de
visita é limitado, e o funcionário gentilmente pede para descermos após cinco
minutos. A taxa de entrada é bem pequena. Vale muito à pena.
Já montados na bicicleta novamente,
fomos até os bairros Fátima, Horto e Jóquei, onde almoçamos. Enquanto estávamos
no restaurante, houve uma queda de energia, só não sei se era apenas no bairro
ou em toda a cidade.
Ficamos realmente felizes por escolher
voltar de Teresina para nossa terra, podendo conhecer a última das capitais do
Nordeste. É saudade que fica, mas quem sabe não voltamos para lá outro dia, assim
como já fizemos em outros lugares. Mais uma grande aventura de cicloturismo
pelo nosso rico e lindo país. Qual será a próxima?
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